Crescente maré de ódio no Brasil já atinge as
crianças. Mães e pais usam seus próprios filhos para propagandear
intolerância, raiva e discriminação. Como serão e como estarão esses
meninos e essas meninas num futuro próximo?
Um vídeo abjeto foi postado no Youtube [vídeo abaixo]. A vítima é o menino João Hélio, de apenas cinco anos, que teve sua imagem exposta pela própria mãe. Nas cenas, ele é estimulado por ela a dizer que o ex-presidente Lula cortou o dedo mindinho, quando operário, para assim poder roubar o povo brasileiro.
Segundo o Estatuto da Criança e do Adolescente, a atitude da mãe configura um crime. Diz o artigo quinto do ECA que “nenhuma criança ou adolescente será objeto de qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão, punido na forma da lei qualquer atentado, por ação ou omissão, aos seus direitos fundamentais”.Nas imagens, João Hélio é usado e explorado pela mãe para vocalizar uma intolerância política que é dela – e não dele. Afinal, com cinco anos de idade, uma criança ainda é considerada incapaz.
Acompanhado de um fotógrafo do Mídia Ninja, um jornalista do Portal ImprenÇa acompanhou o olhar das crianças na questão do impeachment no último domingo, 15/03, na avenida paulista. O conteúdo coletado é estarrecedor e comprova o ódio e a intolerância plantados pelos pais nas cabeças dos seus filhos.
Em artigo publicado no Diário do Centro do Mundo, Kiko Nogueira também comentou a respeito do ódio:
Está-se criando uma nova geração
alimentada por uma dieta retórica que inclui a calúnia, o
enxovalhamento, a demonização e a intolerância.
A mãe acha feio o moleque mandar
alguém tomar no cu — a não ser que seja aquela velha nojenta que aparece
na televisão ou o barbudo safado. Nesse caso, vamos rir todos juntos.
Hahahahaha. Você não precisa ser um pedagogo para saber que isso não é
lá muito saudável.
A doutrinação não é apenas tolerada,
mas estimulada. Ninguém deve se surpreender se, daqui a pouco, aparecer
um boneco do dinossauro Barney dizendo “Vamos matar petralhas” se você
apertar sua barriga.
No último final de semana, eu e minha
companheira fomos à primeira reunião do ano na escola pública em que
meus filhos estudam. Poderíamos ter matriculado os dois numa escola
particular, pois temos os recursos para isso. Inclusive, para nós seria
muito mais fácil: não teríamos que contratar uma babá, não teríamos que
encher os dias deles com outras atividades.
Apesar disso, escolhemos deixá-los na
escola pública que fica praticamente atrás do condomínio onde moramos,
pois os professores que lá ensinam têm uma grande dedicação, e por causa
disso a escola, a despeito de todos os seus problemas (que não são
poucos) conseguiu que seus alunos tirassem boas notas no SARESP, e hoje é
uma das melhores escolas públicas do estado. E além disso, frequentar
essa escola é ter a chance de entender que existe um mundo diferente
além dos muros do condomínio onde vivemos, e entendo que é essa também
outra função da escola: expandir o tamanho do mundo que temos em nossas
cabeças.
Pois bem: a diretoria e os
professores estão preocupados. Mais do que isso, estão verdadeiramente
assustados. A tensão entre os alunos tem atingido níveis preocupantes,
segundo eles. Os alunos estão mais agitados e ansiosos do que nunca.
Mesmo meu filho, que sempre foi da paz, que detestava ter que se
defender quando fosse necessário, tem dado sopapos nos colegas. Que
revidam, ensopapando-o também. De onde veio tanta agressividade? Não me
lembro de isso ter sido relatado pelos profissionais da escola há um
ano, quando meu filho começou a ir na escola e que foi o ano
imediatamente posterior às jornadas de junho 2013. O que mudou?
A única resposta que consigo enxergar
é a eleição do ano passado, onde a mídia fez de tudo para rachar o
país, impondo o jogo de “nós vs. eles” – jogo no qual todos nós fomos
tragados, cada qual em seu campo, e que um dos lados insiste em
continuar jogando, mesmo que a fatura tenha sido liquidada no 2º turno.
Desde então, o ódio ininterrupto tem sido a tônica da mídia. E isso,
claro, contamina as pessoas. Além de mim, quem é que não assiste o JN
toda noite? E quem disse que outros jornais contam uma história
diferente, nuançada? Como diz minha companheira, é um bombardeio sem
limites, todas as noites. Não sei se eu mesmo não teria sucumbido, se
assistisse jornal toda noite. E isso, independentemente da classe
social, porque a mensagem que é passada a quem tem TV por assinatura é a
mesma.
No rádio, é a mesma coisa. Um colega
me conta que só ouve a Jovem Pan porque ela fica malhando o governo
municipal ininterruptamente, sem dó nem piedade. Por que esse prazer de
se lambuzar de ódio, de raiva? Detalhe: esse cara vai ser pai em breve! O
que será que ele vai ensinar ao filho dele? Imaginem agora isso
transplantado pros pais das crianças que frequentam a escola – não só a
de meu filho, mas também todas as outras. Isso é bom para as crianças?
Isso é bom para as famílias? Pois o que acontece com isso é que o
niilismo acaba por ser instilado em crianças de 7, 8 anos de idade. É
isso que a mídia quer? Que as crianças cresçam completamente descrentes
do futuro e se transformem em meros consumidores, ao invés de cidadãos?
Eu sempre tive, e ainda tenho,
esperança no presente e no futuro do Brasil. Porém, com essa barragem de
ódio, fica cada vez mais difícil viver o presente e construir o futuro.
É incrível que as pessoas não se dêem conta que não se constrói uma
nação trazendo o ódio e raiva para dentro de casa e fornecendo-o em
grandes colheradas aos filhos. E que além de não construirmos o futuro,
percamos o amor do presente – pois todo o ódio que instilarmos nos
outros, um dia, se voltará contra nós. É isso que esses pais tão
amorosos desejam? Esses pais, que entregam crianças cada vez mais
ansiosas nos portões das escolas, para que aprendam desde pequenas que o
outro, o diferente deve ser esmagado? É isso?
Será que vou querer viver o futuro que este presente prenuncia?
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