6 de jun. de 2009

Palestina do Espetáculo Triunfante

Do Professor Idelber Avelar - 06.06

Uma das regrinhas que organizam o blogroll d'O Biscoito Fino e a Massa é a eliminação dos links a blogs não atualizados há, digamos, três meses. É uma forma de manter as recomendações em dia e abrir espaço para novos interlocutores que chegam. Essa regra possui uma única exceção, um blog atualizado pela última vez em junho de 2008 e que aqui continuará para sempre: Palestina do Espetáculo Triunfante. A exceção se apóia num motivo bem simples. Eu considero Katarina Peixoto a inteligência mais fulminante que já blogou em língua portuguesa.

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Poesia e filosofia mantêm, sabemos desde Platão, um vínculo difícil e acidentado. Nos textos de Katarina, jóias raras, acontece essa coexistência entre o aríete poético e o pensamento mais rigoroso. Trata-se de um acontecer, mesmo, cintilante. Se você cochila, passa batido.

É verdade que os textos de Katarina não são para todos. Não porque você tenha que ser Mestre em Filosofia como ela, ou conhecer em minúcias a tradição que vai de Heráclito a Nietzsche, como ela, ou manter disposição de luta por justiça social comparável à dela – pouquíssimos seres humanos se comparam a Katarina nesse quesito. Os textos não são para todos porque eles pressupõem que o leitor se entregue à intempérie da linguagem; que esteja disposto a revirar até a última gota cristalizada de medíocre senso comum que nos habita.

Nada do que fiz aqui na cobertura da eleição de Obama se compara às poucas linhas que escreveu Katarina na noite histórica: Porque hoje, nesta noite, os profetas do apocalipse e das variantes deterministas rastaquera estão mudos. Devem estar. Porque os charlatães internacionais e os trapaceiros de balcão – engordurado – de falsas idéias e palavras de aluguel estão sem audiência [...] Porque quando a possibilidade soa como um átimo, esse átimo merece eternidade. Se não se entende, com essas palavras, a significação histórica da eleição de Barack Obama, desculpe-me, mas eu não saberia explicar melhor. Talvez outra frase de Katarina ajude: a gramática da possibilidade pode ser um acaso feliz na história, mas é preciso saber cavá-lo, nem que seja no céu, ou na ponta de um iceberg.

A Palestina é, sobretudo, um blog corajoso, escrevendo sobre Chávez, usando a fábula para a análise política, fazendo crítica cinematográfica ou literária. Leia O Piauí da Revista não existe. Leia a defesa das cotas. Leia esse extraordinário texto sobre o sertão. Leia O dia em que descobri que sou suda. Leia a reflexão sobre o Fórum Social Mundial. Trata-se do oposto daquele jornalismo filistino pretensamente neutro, que quer sair-se bem com todo mundo, manter-se equidistante entre as escolhas políticas, só conseguindo, no final, ficar equidistante entre a barbárie e os que a resistem – sendo cúmplice útil daquela, portanto. Não. No texto de Katarina, você encontrará, em bom português, a tradicional “cara a tapa”, a coragem de dizer: A abertura do inventário de Maio 68 constitui fraude porque seu atestado de óbito insiste, por incrível que pareça, em não existir.


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Leitora de Spinoza, Katarina sabe que a moral é universalizável, mas a política nunca o é. Diferença tão simples não exigiria, supõe-se, tanta tinta e tantos bytes, mas não há confusão mais daninha para o Brasil de hoje. É essa a confusão que permite que zumbis do espetáculo triunfante como Regina Duarte e Ana Maria Braga possam traficar cantilena moralizadora como se fosse alternativa política.

Katarina deixou de blogar, mas continua traduzindo dezenas de textos para a Agência Carta Maior, do inglês, do francês, do espanhol. Uma busca com seu nome retorna 129 ensaios. Pura generosidade de quem coloca seu vasto saber a serviço dos demais. Como sabemos, tradutores só são lembrados quando erram. E Katarina, como tradutora, não erra nunca. Mas, aqui, esse seu trabalho também não foi esquecido. Obrigado.

Amiga, não tome este post como um pedido para que volte a blogar. Você sabe o que faz. Aqui, neste cantinho da internet, a Palestina estará para sempre. Como você disse uma vez, nenhum continente nos separa.

2 comentários:

  1. Olá Marcia,
    Obrigado pelo comentário no meu blog.
    Gostei da sua página e já adianto que estou linkando no meu blogroll.
    Sempre que conheço um novo(e bom) blog, gosto de ajudar a divulgá-lo.
    Parabéns e abraço,
    Guina - Tribuna Petista

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  2. Olá Guina.
    Agradeço muito a sua participação, há recíproca dos nossos ideais.
    Uma das bandeiras que eu acredito e tenho levantado, hoje, é a conscientização da massa para mostrar a realidade, defesa da ética e da cidadania.
    Para que isto aconteça a união de jornalistas, estudantes, políticos, educadores e população, realizaria a construção de uma nova visão de idéias, dividir o conhecimento sem distinção de poder ou de mentes, sem preconceito.
    Infelizmente, divergências dentro dos grupos, sindicato, estudantil, ou mesmo a falha na interação de educadores e jornalistas, tem contribuído para uma comunicação conturbada e que defende interesses pessoais.
    Os grupos discutem isoladamente, esquecendo do principal, do social.
    Precisamos acabar com a maior guerra que o Brasil enfrenta, a dispersão e a manipulação da parceria da mídia e políticos sem ética.
    Vamos nos falando.
    Gde Abç

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