Do Blog da Raquel Rolnik - 01.03.12
Itaú e Bradesco estão disputando quem poderá instalar um sistema de
aluguel de bicicletas na cidade de São Paulo. O Itaú já explora o
serviço no Rio de Janeiro, desde outubro do ano passado, em parceria com
a prefeitura. Lá o sistema conta com 600 bicicletas, espalhadas em 60
pontos de bairros da zona sul e do centro. Não é muito difícil imaginar
onde serão os pontos de aluguel em São Paulo…
Aqui a previsão é de que sejam disponibilizadas entre 3 mil e 5 mil
bicicletas, com a primeira hora de uso gratuita, como acontece no Rio. A
partir da segunda hora são cobrados R$ 5 por hora, mas não há limites
no número de viagens diárias — com um cadastro mensal que custa R$ 10,00
é possível realizar várias viagens diárias desde que cada viagem não
ultrapasse 60 minutos e que haja um intervalo de 15 minutos entre cada
uma. Para saber mais, clique aqui.
Poder acessar uma bicicleta para percorrer pequenos percursos ao
longo do dia é, evidentemente, uma iniciativa muito positiva, mas, tanto
pelo baixo volume de bicicletas (para se ter uma ideia, em Paris,
um sistema semelhante disponibiliza 20 mil bicicletas em 1.800
estações), quanto pelo custo e modelo (várias pequenas viagens ao longo
do dia), o sistema termina sendo voltado muito mais para lazer e turismo
do que para as necessidades da população que realmente usa a bicicleta
como meio de transporte diário, sobretudo casa-trabalho ou casa-escola.
O mesmo podemos afirmar em relação às iniciativas recentes de
implantação de ciclofaixas e ciclovias nas cidades brasileiras — como é o
caso das ciclofaixas de domingos e feriados em São Paulo, que hoje
conectam parques da zona oeste e sul, ou das ciclovias à beira mar em
algumas cidades. Nada contra sua existência, apenas cabe a pergunta: a
que ciclistas elas atendem?
O fato é que iniciativas como essas não dão conta da real demanda da
população com relação ao transporte não motorizado (a pé e por
bicicleta). Segundo a última pesquisa Origem e Destino do metrô,
aplicada na Região Metropolitana de São Paulo, esse tipo de deslocamento
teve um aumento de 18% entre 1997 e 2007. De acordo com a pesquisa, em
2007, dos 304 mil usuários de bicicleta de São Paulo, 61,5% tinham renda
familiar de até R$ 1.520,00. Além disso, 22% das viagens de bicicleta
têm por motivo o alto custo da condução e 57%, a pequena distância da
viagem – imagino que aí estejam incluídas as milhares de pessoas que se
deslocam de bicicleta até a estação de trem e de lá seguem para o
trabalho em várias regiões do município ou em cidades da Região
Metropolitana, como Suzano, Mauá e outras. Segundo reportagem especial
do Jornal da Band esta
semana, mais da metade das 60 milhões de bicicletas que existem hoje no
país são usadas pela população para ir ao trabalho.
Para essas pessoas, para quem a bicicleta é meio de transporte
cotidiano, é preocupante a quase total ausência de políticas públicas de
mobilidade urbana que incluam a bicicleta como modo. É importante
lembrar que, no ano passado, a Secretaria de Transportes de São Paulo
tinha previstos em seu orçamento R$ 15 milhões para o desenvolvimento do
Plano de Mobilidade da cidade e nada fez; isso também vale para outras
cidades: em Fortaleza, por exemplo, desde 2010 foi aprovada a Lei 9.701,
que trata do Sistema Cicloviário, mas suas determinações nunca saíram
do papel.
É muito positivo que em nossas cidades estejam crescendo, ainda que
lentamente, a quantidade de ciclovias e ciclofaixas e que sistemas de
aluguel de bicicletas estejam sendo implementados. Mas essas iniciativas
precisam ter foco e prioridade, ou seja, precisam ser parte de
políticas de mobilidade que compreendam a bicicleta como meio de
transporte utilizado por milhares de pessoas nas cidades.
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